"O serviço público tem características diferentes da iniciativa privada: nós temos um limite para a remuneração, não dispomos de FGTS e, principalmente, para recebermos um aumento de salário, é preciso a aprovação de uma lei."
Se dependesse apenas dos servidores públicos federais, o projeto de lei que cria a previdência complementar para o setor público já estaria arquivado. Eles não concordam com o ponto principal da proposta: a obrigatoriedade de contribuições extras para aqueles que desejarem aposentar-se com um benefício superior ao teto pago pelo Regime Geral da Previdência Social (RGPS) - fixado, hoje, em R$ 3.691,74, que é o recebido pelos trabalhadores da iniciativa privada.
Quando enviou a proposição ao Congresso, em 2007, o então presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, argumentava que o texto daria continuidade à reforma da Previdência - iniciada em 2003 com a Emenda Constitucional 41 - cujo objetivo era garantir os recursos necessários ao pagamento de todas as aposentadorias e pensões.
Na justificativa do projeto, o Executivo alegava que a implantação da previdência complementar levará a uma "desoneração das obrigações da União", já que os valores superiores ao teto do RGPS passarão a ser pagos pelas contribuições que os servidores farão a mais, e não pelo Tesouro Nacional. Com isso, o governo pretende "recompor a capacidade de gasto público em áreas essenciais à retomada do crescimento econômico".
Nesses três anos em que tramita na Câmara, o projeto passou apenas pela Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público, na qual recebeu parecer favorável, na forma de substitutivo, do deputado Silvio Costa (PTB-PE). O texto já foi encaminhado para a Comissão de Seguridade Social e Família, mas ainda precisa do referendo das comissões de Finanças e de Constituição e Justiça.
Urgência - O tema voltou a ganhar destaque porque chegou ao Congresso uma mensagem da presidente Dilma Rousseff em que solicita o regime de urgência para a matéria, de modo que, se não for votada dentro de 45 dias, passa a trancar a pauta. Com a manobra, a proposição precisará do voto de pelo menos metade dos deputados em plenário.
Para evitar que o texto seja aprovado como está, o Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado (Fonacate) - instância que reúne entidades representativas dos servidores do Executivo, do Legislativo, do Judiciário, do Tribunal de Contas da União e do Ministério Público - prepara uma campanha de repúdio à iniciativa. "O serviço público tem características diferentes da iniciativa privada: nós temos um limite para a remuneração, não dispomos de Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e, principalmente, para recebermos um aumento de salário, é preciso a aprovação de uma lei", diz o presidente do Fonacate, Pedro Delarue, para explicar a resistência dos servidores em aceitar um teto para a aposentadoria semelhante àquele do RGPS.
Para Costa, servidor tem privilégios
Autor do substitutivo ao projeto de lei que cria a previdência complementar para os servidores públicos federais, o deputado federal Sílvio Costa (PTB-PE) garante que a proposta, além de "ajudar a sanear as contas da União", ainda vai acabar com "privilégios" dos que hoje estão empregados na máquina pública.
"Por que o servidor público pode se aposentar com o vencimento integral e o trabalhador comum tem um teto?", questiona o parlamentar, que lembra que o projeto não prejudicará os atuais servidores. "Só vai valer para aqueles que entrarem após a lei ou que optarem pelo regime complementar", explica.
Costa atribui as críticas ao projeto ao "corporativismo". De acordo com ele, algumas entidades "lançam boatos sem sentido" ao afirmarem que quadros qualificados preferirão a iniciativa privada. "O que o cara quer no serviço público é a estabilidade, é não ser demitido. E nisso nós não mexemos".
Paulinho da Força diz que projeto só resolve metade do problema
O presidente da Força Sindical, o deputado federal Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), é um dos mais ferrenhos opositores ao projeto de lei que cria a previdência complementar para os servidores públicos federais. Quando o projeto de lei passou pela Comissão de Trabalho, o parlamentar apresentou um voto em separado em que tenta demonstrar que a solução não acabará com o déficit da Previdência, que chegou a R$ 52,7 bi em 2010.
"Esse montante, porém, não se refere apenas aos gastos dos servidores civis, os únicos que serão alcançados pela previdência complementar", declarou Paulo Pereira da Silva. Ele entende que o problema está no pagamento de pensões e aposentadorias de militares, que consumiu no ano passado R$ 21,4 bi. Como a contribuição previdenciária dos militares foi de apenas R$ 1,8 bi, a participação do Tesouro chegou a 91,59% do valor total. "Por essa conta, os militares respondem por 37% do déficit de toda a previdência do setor público", resumiu o deputado.
"Não dá para implementar um plano que resolva o problema pela metade", disse Paulo Pereira da Silva, para quem "o governo precisa de uma solução que alcance também os militares e os servidores lotados no Distrito Federal".
Fonte : Fonacate